No mês de junho, fizemos uma palestra aberta e gratuita para apresentar algumas percepções que tivemos após nos debruçarmos no estudo da pesquisa Tudo que você gostaria que seu RH soubesse.

Logo no começo da conversa, Isabella falou um pouco sobre uma epidemia que vivemos dentro das empresas brasileiras: a da ignorância emocional. E como, por isso, aprendemos a chamar todo desconforto relacionado ao trabalho de burnout.

Isso nos leva a alguns problemas importantes! O primeiro é que esse “diagnóstico” costuma ter um efeito manada dentro das equipes. Se uma pessoa levanta a mão para verbalizar que tem burnout, isso é como uma espécie de autorização para que outros possam também fazer isso. O segundo é ainda mais preocupante: não existe “burnoutzinho”. O burnout, quando diagnosticado corretamente, tem um efeito intenso e bastante importante no cotidiano de uma pessoa, pode ser avassalador e impactar aquela vida em muitos níveis diferentes: família, casamento, vícios, casa, finanças, corpo.

Portanto, isso que Isabella explica no vídeo que chamamos de ignorância emocional, não tem um cunho pejorativo. É preciso urgentemente abrir conversas de conscientização dentro das empresas para aprendermos a nomear e reconhecer nossos desconfortos, de forma que possamos reduzir o risco de negligenciarmos um diagnóstico sério. O problema de colocar tudo na mesma caixa é que o “burnoutzinho” se torna viável, e isso pode reduzir as chances de tratamentos urgentes (enquanto eles são possíveis).

Existe burnoutzinho?

Durante todo este ano, estou me dedicando a um curso no Instituto Sedes Sapientiae chamado “Saúde mental relacionada ao trabalho”. Em um dos encontros, tivemos uma aula com Renata Paparelli, psicóloga que faz um trabalho maravilhoso lá na PUC São Paulo, em que acompanha pessoas adoecidas por conta da relação com o trabalho. 

Durante a aula, tive uma percepção muito mais abrangente do que é burnout e como um diagnóstico tardio pode ser irreversível. Os estudos de caso que acompanhamos no curso são de quebrar o coração em muitos pedaços. 

No nível coletivo, não consigo imaginar outra forma de lidar com isso que não passe por uma mudança cultural em muitas empresas, com medidas estruturais como revisar quantidade de trabalho, pressão por resultados, metas, flexibilização do controle, entre outras

Perguntei para Renata se há algo possível de ser feito no nível individual. Ela explicou que existe uma característica comum entre pessoas que apresentam esse diagnóstico:

“Geralmente são as pessoas que as empresas amam contratar. São aquelas muito envolvidas com o objeto de trabalho, há excesso de engajamento. (…) É muito comum essa variação em quem tem burnout: transformação de alguém com muita energia para alguém cuja potência de vida acabou.” [Professora Renata Paparelli]

Então ela traz uma resposta possível para minha pergunta: no nível individual, podemos olhar para nosso processo de trabalho e avaliar qual nosso nível de governabilidade diante daquilo. Sem ignorar o fato de que ainda temos um horário a cumprir, metas para bater e projetos para entregar, o que pode ser “cortado”?

Para além de toda a responsabilidade que cabe à organização, que é garantir dignidade para as pessoas, como podemos cuidar para que o estresse de hoje não vire um burnout amanhã? Essa é uma pergunta urgente porque, infelizmente, burnoutzinho não existe. E, como disse a professora Renata, depois do burnout vem um “esvaziamento da vida”. Espero, de coração, que ninguém mais precise passar por isso!

Ouça uma entrevista que fizemos com o médico Paulo Carvalho sobre burnout